Imagem de Fatal Frame: Maiden of Black Water
Imagem de Fatal Frame: Maiden of Black Water

Fatal Frame: Maiden of Black Water

Nota do Voxel
85

Enquadrando o desespero

Nem Kirie, nem Sae, nem Reika. Trazer a franquia Fatal Frame de volta para as terras ocidentais foi o maior desafio que a comunidade já passou pelos últimos anos. E, convenhamos, foi um verdadeiro exorcismo. Quando Fatal Frame: Maiden of Black Water foi anunciado, lá na metade de 2014, os fãs ficaram enraivecidos pela exclusividade aos consoles japoneses. E nós tínhamos razão para ficar extremamente abalados com essa notícia.

A série dos paparazzis de fantasmas fez nome ao Survival Horror na época do PlayStation 2. Fatal Frame II: Crimson Butterfly entregou uma das experiências mais aclamadas do gênero, com direito a ambientações macabras e mecânicas de batalha que criavam verdadeiras lendas urbanas entre os amigos que sugeriam jogos uns aos outros. Fantasmas e câmeras: uma combinação que gera tensão até na rima.

Mas, desde que a Nintendo adquiriu a exclusividade da série, nunca mais vimos uma sequência por aqui. Fatal Frame: Mask of the Lunar Eclipse estreou como o quarto título, mas este nunca teve um lançamento planejado fora do Japão. Um remake do segundo jogo até que conseguiu quebrar a barreira, mas não representou a confiança que a Big N precisava para nos animar com um novo game.

Empolgados com o anúncio de uma sequência recente da série, os fãs se organizaram para chamar a atenção da Nintendo para que a volta ao Ocidente finalmente acontecesse. Graças à comunidades persistentes como a Operation Zero, os jogadores foram incentivados a fazer todos os tipos de pedidos possíveis à empresa. Depois de meses, o resultado veio positivo: conseguimos o que tanto queríamos e Fatal Frame voltaria para o lado de cá do globo no final de 2015.

A emoção foi grande. Fatal Frame estava vivo novamente, mas a grande pergunta ainda persistia: será que a série conseguiria se manter entre os títulos mais assombrados dos games mesmo depois de anos longe do terreno onde fez tanto sucesso? Eis que a resposta está na ponta da sua lente.

Eu vejo gente morta!

Rituais macabros são a marca registrada de Fatal Frame e o mais recente título não deixaria isso de lado. A montanha Hikami, palco de diversos suicídios e assombrações, conecta a história de três diferentes personagens: Yuri Kozukata, uma garota com poderes sobrenaturais, Miu Hinasaki, uma garota perdida que procura sua mãe, e Ren Hojo, um autor que procura entender melhor sobre seu passado.

Como de costume, as almas penadas terão o papel principal para infernizar o objetivo de cada um deles. A região, que é inspirada em um local real do Japão, atrai todas as pessoas que querem acabar com a sua vida, mas uma cerimônia fracassada que ligava o mundo dos vivos e dos mortos não deixa que os espíritos descansem em paz. Uma narrativa que mergulha na essência da série, mas que aos poucos encaixa elementos que a tornam diferenciada aos fãs.

Já que tocamos nos aspectos clássicos, a ambientação dos títulos antigos está em peso por aqui. Embora alguns momentos da narrativa envolvam florestas e espaços abertos, a claustrofobia gerada por corredores apertados ainda contribui massivamente no suspense sobrenatural.

Não é incomum que você tenha que entrar em uma casa para procurar pessoas ou continuar a história. É aí que a jogabilidade nostálgica é importada com maestria: as portas abrem lentamente e os elementos do cenário estão posicionados de forma estratégica, criando o ambiente perfeito para você não ficar tranquilo.

As minúcias ainda chamam a atenção, recapitulando outra essência da série. Os meus primeiros momentos por Fatal Frame III: The Tormented foram contornados por um pavor anormal a um simples elemento do cenário. A primeira boneca que minha lente encontrou no jogo simplesmente virou a cabeça em minha direção. Sem. Motivo. Algum.

Detalhes assim ainda estão presentes em Maiden of Black Water. Um outro brinquedo me encarou ao entrar em uma sala, mas, pelo prazer da exploração, optei por ignorar ela e vasculhar o local. Item aqui, animação ali e um fantasma passa pelas suas costas. Quando a adrenalina acaba, você percebe que aquele objeto anteriormente imóvel se mexeu e está olhando na sua direção. Não é nada agradável — ainda mais se estiver jogando naquele ambiente solitário e escuro.

Elementos pequenos constroem a tensão geral exatamente dessa forma. Ativar a câmera é também estar aberto às surpresas, sejam elas de fantasmas aleatórios ou daquela cabeça de madeira pendurada que você não viu antes.

Dessa forma, quem sabe você comece a ter receio dos detalhes do cenário depois de um tempo. Assim como eu e minhas bonecas de madeira.

Evoluindo com o tempo

Um aspecto importante e que merece ser ressaltado é o tema extremamente sensível que Fatal Frame aborda daqui em diante. O suicídio não é um tema comum nas mídias: a convenção é que não se fala disso para não incentivar a prática. A própria série pincela alguns momentos em que isso acontece, mas geralmente é o resultado do desastre iminente dos rituais.

Confesso que foi difícil acreditar que, em um console tão conhecido por jogos casuais e familiares, uma temática destas pudesse aparecer com tamanho peso e influenciar os próprios personagens do jogo. Não é fácil passar despercebido a uma das vítimas que, sobrevivendo a uma tentativa de suicídio no passado, acaba com o pescoço cortado por influência da maldição.

É uma experiência inédita ao horror, embora isso embargue uma série de reflexões sérias a respeito do assunto.

Batalhar com essa legião de espíritos se tornou mais interativo e interessante. O gamepad do Wii U assume o papel da Camera Obscura durante a jogabilidade, incluindo uma sensibilidade ao movimento que contribui na imersão.

Embora a interação entre o gamepad e a câmera pareça ser perfeita, os primeiros momentos como fotógrafo são um pouco confusos. Se adaptar à sensibilidade e aos controles pode demorar um pouco mais do que o normal até mesmo para os veteranos na série.

Ambientes muito pequenos provaram ser um desafio com essa dinâmica, pois o nível de precisão é altíssimo nesses momentos e o controle não acompanha esse requisito ou apresenta algumas falhas pequenas na sensibilidade.

Com prática, é possível controlar melhor os movimentos principalmente durante as batalhas, ainda mais se você dominar a função “Lock” (ZL) da câmera. Além disso, os controles clássicos também estão disponíveis aos que não se acostumarem com a sensibilidade do gamepad, amenizando muitos dos problemas que os jogadores possam ter.

Além do do gamepad, as batalhas ganharam elementos novos que influenciam no seu sucesso. A água, um dos temas principais durante a história, irá afetar os personagens diretamente. Chuva, rios e cachoeiras estarão cercando você em muitos momentos, e ficar molhado também aumentará sua vulnerabilidade — tudo isso por meio de um sistema que lembra muito o “miasma” de Fatal Frame III: The Tormented.

Os inimigos fantasmagóricos são um dos destaques dessa edição. A movimentação e os ataques dos espíritos lembram muito a forma como foram mortos, influenciando o jeito como eles ameaçam o mundo dos vivos. Uma das vítimas enforcadas, por exemplo, irá atacar com uma corda e tentar matar os protagonistas dessa forma, demonstrando uma evolução que se afasta dos "zumbis fantasmas" que encontrávamos frequentemente nos corredores dos primeiros jogos.

A própria câmera ganhou recursos diferentes. O dano é influenciado pela quantia de “círculos” que você captura na tela, adaptando as batalhas para as rotações possíveis com o gamepad. Além disso, novas lentes e atributos abrem as opções dos jogadores para aprimorar a sua “arma” da forma como quiserem.

Há uma mecânica em especial que contribui para a narrativa de forma impecável. Ao vencer uma batalha, é possível “tocar” a assombração por meio do “Fatal Glance”, presenciando como a pobre alma morreu e ficou naquele estado.

O diferencial disso é que, anteriormente, só conhecíamos a história das vítimas por meio de arquivos ou por anotações nas fotos. Aqui, há uma aproximação muito mais chocante com cada um dos inimigos. Agora vemos, em detalhes, quais foram os últimos suspiros deles. Isso enriquece e muito a história.

Exorcismos desnecessários

Fatal Frame: Maiden of Black Water não contou só com evoluções em frente à franquia. Alguns elementos clássicos, principalmente aqueles muito amados pela comunidade, acabaram ficando de fora dessa versão. Pra começar, é justo relembrar do modo de missões, anteriormente desbloqueado depois que o jogador vencesse o jogo. Infelizmente, hoje esta possibilidade descansa em paz no cemitério da franquia.

Recomeçar o jogo é para poucos, nós sabemos. Só que, antes, a Tecmo demonstrava mais atenção aos fãs que se aventuravam por isso, oferecendo conteúdos aos que tinham o simples prazer de continuar saboreando desafios e oportunidades específicas do jogo.

Entrar no menu de história também é estranho para qualquer fã de Survival Horror. A sequência importou um sistema de episódios que não combina muito com a narrativa clássica de um jogo de terror.

É justo considerar que este modo está ali para oferecer uma aventura fragmentada aos jogadores “New Game +”, ainda mais quando temos agora uma história de mais de 16 horas. Mas ele oferece uma quebra de ritmo que antes não acontecia na narrativa, principalmente por repetir os acontecimentos do jogo todas as vezes que você inicia e finaliza cada um dos capítulos.

Tudo isso sem falar em outros elementos que já adiantam a minha situação na história. Inclua aqui informações como o número de protagonistas e a porcentagem da história que foi concluída. Afinal, eu precisava mesmo saber que estou chegando na parte final do jogo?

Ah, também não espere morrer muito neste game. Outro aspecto negativo do sistema de episódios é que os itens curativos são reiniciados e comprados a cada novo capítulo por meio de pontos, e isso não seria um inconveniente se os medicamentos continuassem escassos. O problema é que até mesmo o modo normal oferece uma quantia absurdamente grande de itens de cura, diminuindo a sensação de pânico quando um fantasma começa a te dar trabalho em uma batalha.

No títulos antigos, tínhamos no máximo duas ou três "Herbal Medicines" para lidar com todos os desafios até finalmente encontrar um novo item de cura. Aqui, já começamos um episódio com cerca de 20 a 30 medicamentos, neutralizando aquela dor no coração ao acessar o inventário para recuperar a vida. E, convenhamos, este é um dos fatores que ampliam e muito o desespero no Survival Horror — ou você não chorava quando suas ervas acabavam em Resident Evil?

Sinta-se imortal com tantos itens

Caso você já tenha terminado o game uma vez, vai se deparar com outros elementos novos para continuar a exploração. A “Ghost List” ainda marca presença, incentivando os jogadores a capturar todas as aparições fantasmagóricas. Além disso, as famosas roupas adicionais e os finais alternativos precisam ser desbloqueados conforme vários requerimentos, mostrando que ainda temos uma essência da série muito persistente por aqui.

No entanto, os fãs também sentirão muita falta dos tradicionais quebra-cabeças. Como destemido aventureiro que sou pelos games nostálgicos do terror, a ausência dos puzzles começou a me incomodar a partir do quarto capítulo.

Essa retirada tenta trazer dinamismo para a exploração dos cenários, adaptando estes desafios para fotos em locais e ângulos específicos. Mas, ainda sim, ficou aquele sentimento de que a Tecmo deu as costas às raízes clássicas do gênero. Os jogadores precisavam estar mais atentos aos detalhes para conseguir resolver os quebra-cabeças e avançar pela história.

E, já que tocamos novamente no aspecto da exploração, é necessário lembrar que este título em específico traz cenários muito vastos e que aproveitam ao máximo o processamento gráfico do Wii U. Com a exceção de um "crash" no sistema ao acessar o menu de fotos, nenhuma queda de desempenho ou outro problema relacionado apareceu, trazendo uma experiência lisa mesmo com muitos detalhes pela tela.

Para facilitar a localização, o gamepad também funciona como mapa para evitar que você fique perdido em templos grandes e florestas extensas. Afinal, quem quer ficar perdido em uma trilha com fantasmas por todo o lado?

Esse frame é um Frame Fatal

Na fotografia, a regra dos terços existe para trazer a harmonia e o movimento para uma imagem eternizada pela câmera. Os games também precisam desses elementos para manter o jogador sempre envolvido pelo título. Posso dizer, com isso, que a Tecmo encontrou o ângulo ideal em Fatal Frame: Maiden of Black Water, mas o foco não ficou perfeito.

Os tradicionalistas na escola do Survival Horror podem acusar que a série “perdeu o que tinha de melhor” e trouxe um dos títulos menos aterrorizantes já vistos. Não nego que, em todas as minhas aventuras pela franquia, este jogo causou o menor número de sustos legítimos. Mas um desfecho previsível não significa que a aventura foi isenta de suspense. Muito pelo contrário: aqui temos as cenas que concorrem entre as mais perturbadoras já vistas pelos fãs, e só por isso já vale o desconforto.

Além de tudo, isso não significa que o jogo afoga o terror. Ele pode muito bem trazer momentos de tensão e sustos variados, e tudo vai depender da sua relação com o suspense criado pelo ambiente.

Aos olhos de um eterno apaixonado pela série, o último título corta algumas raízes de forma duvidosa, mas sem dúvidas ele representa um gênero que fazia muita falta ao catálogo do Wii U no Ocidente. Os usuários do console, sejam eles casuais ou não, agradecem e muito por isso.

É justo dizer que Fatal Frame não perdeu a sua essência como Survival Horror. Embora alguns elementos aproximem o novo jogo para uma ação mais leve, o ritual para apreciar o bom terror continua o mesmo: desligue a luz, aumente o som da televisão e esteja pronto para ver coisas que os outros não conseguem ver.

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Pontos Positivos
  • O bom e velho suspense não morreu
  • Tema extremamente chocante
  • Elementos novos redefinem as batalhas e a história
  • Segunda aventura continua chamativa com novos finais, conteúdos e desafios
  • Design caprichado dos adversários
  • Visual explora muito bem o poder gráfico do Wii U
Pontos Negativos
  • Sistemas de episódios e compra de itens quebram a narrativa clássica
  • Elementos nostálgicos da franquia não estão mais presentes, como quebra-cabeças e missões
  • Muitos itens de cura