Imagem de Until Dawn
Imagem de Until Dawn

Until Dawn

Nota do Voxel
90

Você é o diretor! Luz, câmera... e muito sangue

Você está em um corredor escuro e estreito. O vento gelado é forte e faz a janela de madeira bater sem parar, em um ritmo tão acelerado quanto o do seu coração. A escuridão não te deixa enxergar muita coisa, mas levando em conta o que você já viu nesta noite, talvez isso seja uma boa ideia. Você dá passos cautelosos, mas não contém a respiração forte. A porta ao seu lado é repentinamente escancarada, e dela sai um vulto alto, ameaçador. Ele tem uma faca afiada em uma das mãos e a cabeça do seu amigo em outra. Com poucos segundos separando você do que pode ser uma morte certa, o que fazer?

Until Dawn, o novo exclusivo da Supermassive Games para o PS4, coloca você no papel de vítima em um filme de terror e deixa você responder a perguntas como a que foi feita acima. O objetivo é uma imersão parecida com a de um filme (no estilo consagrado por Heavy Rain), mas desta vez com o horror e o suspense como gênero principal.

Mas tem muito terror por aí que começa bombástico e com a corda toda, mas não se sustenta até o fim, deixando você louco para se levantar do sofá e ir fazer outra coisa. Será que o game segue essa cartilha ou é uma homenagem justa e digna aos grandes filmes de serial killer? Confira a análise a seguir.

Uma colcha de retalhos (muito bem bordada)

Antes de tudo, tenho que confessar: eu adoro filmes de terror. Claro que não dá para engolir qualquer coisa, mas vejo desde as superproduções hollywoodianas até os indies de baixo orçamento, passando pelos mais bagaceiros com muito sangue e tripas. E, ao consumir tanto produto parecido, a gente cria uma espécie de filtro: mal precisamos assistir a alguma coisa do gênero por cinco minutos para já saber se aquilo será bom, clichê, surpreendente, instigante ou um pacote de tudo isso.

Com Until Dawn, dá para dizer que a experiência foi essa mistura maluca. Para começar, a própria história de desenvolvimento do game quase virou lenda urbana. Ele foi anunciado pela primeira vez em 2012 como um “jogo em primeira pessoa totalmente baseado no PlayStation Move” para o PS3, mas o projeto foi adiado tantas vezes que mudou de câmera e geração, além de deixar o controle de lado.

Voltando: um ano atrás, um grupo de amigos estava em um chalé nas montanhas isoladas e cheias de neve do norte do Canadá quando duas gêmeas desaparecem ser deixar rastros. Agora, o irmão restante decide dar uma nova festa no mesmo local para honrar a memória das duas e reunir novamente o grupo. Porém, o que aparentemente pegou as moças está de volta, ainda mais com carne nova no pedaço. O seu objetivo? Deixar pelo menos alguém vivo “until dawn”, ou seja, até o amanhecer.

A história é manjadíssima, mas quem disse que isso é um ponto negativo? Ao se afirmar como uma homenagem desde o início, Until Dawn se aproveita dos clichês e estereótipos do gênero para criar uma história divertida que, mesmo não sendo original, é bem contada, interessante e dinâmica. Quem é veterano no terror ainda vai vibrar com pequenas referências que volta e meia surgem da melhor forma possível: visíveis, mas sem forçar a barra.

São várias as inspirações do mundo dos filmes, jogos e livros:  presença de um psicólogo que faz perguntas a você e molda as respostas como acontecimentos do jogo lembra um pouco o estilo de Silent Hill: Shattered Memories. Já a história de cabana isolada tem inúmeras inspirações no cinema, em filmes como “Evil Dead”. O livro “O Apanhador de Sonhos”, de Stephen King, também traz algumas semelhanças com o ambiente gelado. “Jogos Mortais” também tem seus momentos.

A equipe de roteiro do game inclui ainda Larry Fessenden e Graham Reznick, dois escritores e diretores de filmes independentes de terror que são tão apaixonados pelo terror quanto os jogadores.

Os presuntos

A lista de personagens de Until Dawn é divertidamente clichê. Temos o atleta, a menina ingênua, a heroína casta, o rapaz que só quer saber de pegação e por aí vai. Por isso, é inevitável que você simpatize com uns e não vá com a cara de outros. Isso pode (deve e provavelmente vai) influenciar as suas decisões na jogabilidade: quem curtiu Sam tentará expor a personagem a menos situações de risco, deixando ela longe e brigas com os demais.

O elenco é estrelado: os personagens incluem trabalhos de voz, captura de rosto e movimentos de Hayden Panettiere (a eterna cheerleader de "Heroes"), Rami Malek (o hacker Elliot de "Mr. Robot"), Brett Dalton (o agente Grant Ward de "Agentesda S.H.I.E.L.D.) e Peter Stormare (John Abruzzi de "Prision Break").

A dublagem em português é correta, com boa entonação e nada de sotaque gringo. As falas são todas meio exageradas e canastronas, mas esse clima “filme B” é o propósito do jogo desde o início, então podemos relevar. Porém, ela não chega perto das vozes originais, feitas por atores muito qualificados. Felizmente, você altera isso a qualquer momento.

A Maldição dos QTEs — Parte 2: O Retorno

A jogabilidade pode parecer confusa de início, mas você logo se acostuma. São dois momentos em que você participa. No primeiro, controla os personagens em si, explorando cenários para encontrar pistas ou fugindo de perigos. A combinação de botões para pegar um item é estranha (“X” para ação, “R2” para segurar algo e girar o direcional para virá-lo), mas logo vira rotina.

Em outros momentos, durante os diálogos, você precisa selecionar algumas ações ou respostas usando o direcional. Há um tempo limitado para isso, então pense bem, mas também haja rápido.

Por fim, o uso não é tão exagerado quanto em The Order: 1886, mas os quick time events (QTEs) infelizmente estão lá.  Às vezes, subir um inocente muro envolve pressionar os botões na hora correta. Isso quebra um pouco o clima do jogo e tira a sensação de que você tem realmente a liberdade no controle dos personagens.

Um lugar confortavelmente aterrorizante

Uma boa produção de terror precisa de um cenário bem escolhido, seja o Crystal Lake de Jason Voorhees, a pequena cidade de Haddonfield de Michael Myers ou os maquinários industriais dos sonhos com Freddy Krueger. No caso de Until Dawn, a ambientação é chalé nas montanhas. Em vez de algo claustrofóbico, com cômodos apertados e pouco espaço para fugir, a desenvolvedora optou por uma construção detalhada e cheia de novas áreas para visitar.

Os gráficos são bem feitos e você fica bem ambientado, seja nos corredores escuros ou nas florestas cheias de neve. Os efeitos em geral (iluminação, névoa e neve, por exemplo) são todos bem executados. Alguns modelos de rosto causam estranheza no início, mas não há graves problemas e você logo reconhece cada um dos atores do elenco.

Os ângulos de câmera são bem escolhidos e às vezes até imitam filmes como “Predador” (a visão térmica) ou colocando você no ponto de vista de uma ameaça, espionando os mocinhos.

Big Brother da carnificina

“Meu Deus, mulher, não abre essa porta!”. “Ah, capaz que essa faquinha aí vai ajudar em alguma coisa, pega outra arma!”. Esse tipo de reação é normal em filmes de terror: nós não temos o controle da situação e ficamos alucinados com escolhas ruins dos personagens, a maioria delas resultando em uma morte violenta e em um “Viu só? Eu avisei!” do espectador.

A promessa de Until Dawn é a de colocar você no papel do “narrador” que decide as ações do personagem. Correr ou se esconder? Pegar a arma ou esperar para ver se surge alguma melhor? Gritar por ajuda ou permanecer em silêncio? O “efeito borboleta” (ou seja, uma ação terá consequências futuras, talvez em um acontecimento sem relação com o que você acabou de fazer) não só faz você pensar duas vezes antes de fazer qualquer coisa, mas também cria um efeito replay interessante na jogatina. Afinal, o jogador fica curioso para saber o que aconteceria se ele escolhesse um outro caminho.

É mais ou menos o que acontece nesse trailer interativo:

Durante a exploração, você encontra “totens” que mostram flashes do que pode acontecer no futuro, como uma morte ou dicas sobre um caminho a ser seguido. Eles não garantem exatamente uma sequência de eventos, mas podem salvar a vida de alguém.

Ao contrário dos (também excelentes) jogos da Telltale Games, em que várias das decisões que você toma ou geram consequências quase iguais em relação às outras alternativas (com exceção de no máximo uma grande cena por capítulo), aqui você realmente move as peças de lugar e muda as regras do jogo. Claro, não é cada decisão que muda algum destino, mas as principais certamente fazem a diferença. E você nem pode piscar: um mero deslize em uma cena ou um botão pressionado errado pode significar a morte de alguém durante uma fuga.

O problema é que o fator replay, que pode ser a sua chance de salvar personagens e fazer outro final não é tão empolgante quanto deveria, já que não há mais modos de jogo. Ou seja, você precisa jogar todas as cenas novamente — e 90% delas serão iguais — apenas para fazer outras escolhas e coletar pistas que sobraram. Talvez a inclusão de uma dificuldade diferenciada, por exemplo, relevasse esse problema.

Vale a pena?

Until Dawn justifica o próprio nome e faz você querer jogar até o sol raiar. Servindo tanto como homenagem ao gênero de terror (sim, cheia daqueles clichês divertidos) e como uma história interativa que eleva as suas escolhas a um outro nível, o game é uma verdadeira e bem feita sessão de cinema em casa.

A história não é exatamente original e você pode até adivinhar o que vai acontecer depois de um tempo, mas ela não deixa de ser curiosa e bem contada. O ritmo é intenso e o clima de terror consegue ser construído de duas formas possíveis, com suspense lento e jump scares imediatos. O clima até começa ameno, com a apresentação dos personagens, mas jogo vira uma tensão sem fim, com perigos em todas as cenas e a possibilidade real de morte para cada sobrevivente.

Os gráficos são bem trabalhados tanto na ambientação quanto na modelagem de personagens. O áudio é impecável, seja na trilha sonora ou no áudio original — o elenco estrelado faz um ótimo trabalho, bem acima da dublagem “OK” e canastrona em português. O sistema de escolhas não é perfeito e às vezes deixa você com uma falsa sensação de liberdade, mas faz um bom trabalho no geral. Há ainda a presença das infames QTEs, mas a experiência não é estragada por isso.

O final não é totalmente feliz, mas todo slasher carrega alguns defeitos que podemos relevar. Como filme de terror clássico é aquele que ganha sequência até você não aguentar mais, esperamos que o estilo e o clima seja aproveitados em futuros projetos da Supermassive Games. Ao menos nesse capítulo inicial, os fãs ficam sedentos por mais. Por isso, apague as luzes, aumente o som e acomode­-se na cadeira para jogar Until Dawn — só não pegue pipoca, porque aí vai engordurar o controle.

Cupons de desconto TecMundo:
* Esta seleção de cupons é feita em parceria com a Savings United
Você sabia que o TecMundo está no Facebook, Instagram, Telegram, TikTok, Twitter e no Whatsapp? Siga-nos por lá.
Pontos Positivos
  • Trama, personagens e cenas que são homenagens ao terror
  • Gráficos bem feitos com destaque para efeitos de iluminação e neve
  • Elenco competente e ótimo áudio original
  • Momentos de escolha que realmente importam
Pontos Negativos
  • O fator replay poderia ser melhor
  • A presença de QTEs e escolhas com pouca liberdade