Respirador brasileiro feito com máscara de mergulho pode ajudar o SUS

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Imagem: Motirõ/Divulgação

A situação de saúde causada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2) tem gerado a união de profissionais de diversos setores em busca de soluções viáveis para conter os danos da pandemia. Em uma das frentes, estão sendo desenvolvidos projetos de respiradores alternativos e mais baratos para o tratamento da covid-19.

Uma das opções foi apresentada por Luiz Antonio Barbieri, CEO da Owntec, a partir de um projeto nascido na Itália e que é baseado em máscaras de mergulho full face vendidas na rede Decathlon. Seguindo o exemplo da empresa no país europeu, a Decathlon do Brasil também recolheu os produtos das lojas e distribuiu uma quantidade para o projeto Motirõ (lê-se Motirô), que vem trabalhando com foco em apoiar o Sistema Único de Saúde (SUS).

O Motirõ é "um grupo de pessoas físicas, praticamente, que são dedicadas a buscar soluções open source para ajudar nas questões da covid-19", explicou Victor Souza, empresário e voluntário da ONG Expedicionários da Saúde (EDS). O projeto tem, em sua maioria, engenheiros como integrantes, mas participam também empreendedores e profissionais da saúde.

Souza citou a missão de desafogar o sistema público de saúde utilizando máscaras de mergulho como variação para aparelhos de pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP — continuous positive airways pressure). "O respirador é colocado como a única opção no tratamento de pessoas com a covid-19 e, hoje, ainda é. O CPAP entra como uma alternativa para desafogar os respiradores e deixá-los para serem utilizados só nos casos mais graves", explicou Souza.

O tratamento CPAP pode evitar o entubamento de pacientes em até 40% dos casos. "Se eu consigo eliminar 40% desses pacientes [de casos não graves], eu consigo liberar 40% dessas máquinas". Nesse caso, aqueles que não se recuperarem no CPAP vão para os respiradores.

O projeto brasileiro

O Motirõ começou há cerca de 40 dias. O CPAP, que pode ser utilizado em pacientes que respiram normalmente, mas sentem dificuldade de conseguir oxigênio suficiente, passou por algumas modificações até que, de fato, pudesse ser produzido. O principal problema encontrado na criação, contou Souza, é que o método pode liberar gases e criar um problema infeccioso a partir de uma carga viral.

"Em um ambiente hospitalar, a chance de contaminação nos outros pacientes e profissionais de saúde envolvidos com aquele paciente é muito alta", disse o empresário. Com isso, mais pessoas correm o risco de acabar sendo expostas ao novo coronavírus e "desenvolver a doença na sua forma mais grave. Mesmo em mais jovens e saudáveis".

Projeto utiliza máscaras de mergulho para criar respiradores alternativosProjeto utiliza máscaras de mergulho para criar respiradores alternativos.Fonte:  Motirõ/Divulgação 

Foram doadas 2,2 mil máscaras ao Motirõ, que estima que cerca de 30 mil unidades seriam o ideal "olhando para o cenário brasileiro". Os testes vêm sendo feitos em parceria com seis hospitais, incluindo o Hospital de Bauru e o Hospital de Santa Catarina, "ainda em pacientes que não têm covid-19", por causa do problema de vazamento de gás. Mas, segundo Souza, essa questão foi resolvida "fazendo uma adaptação com uma espuma viscoelástica".

O problema ao qual ele se refere foi analisado pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), parceiro técnico do projeto. Um laudo preliminar determinou que há eficiência de 95%. Para Souza, "esse primeiro relatório não levou em consideração o vazamento pelo rosto, que foi resolvido agora com a espuma". Um segundo relatório será publicado em breve.

O voluntário explicou que, nos primeiros testes baseados no modelo italiano, o grupo detectou que havia vazamento de 50% de gases "seja na conexão, seja no rosto das pessoas, que têm tamanhos muito diferentes".

Peça em 3D customizada permite que máscaras sejam compatíveis com equipamentos hospitalaresPeça em 3D customizada permite que máscaras sejam compatíveis com equipamentos hospitalares.Fonte:  Motirõ/Divulgação 

Por se tratar de um projeto open source, o Motirõ tem um fórum de discussão no qual dúvidas relacionadas ao projeto podem ser debatidas.

Apesar de a maioria dos materiais ser doada, o valor unitário de venda das máscaras é de aproximadamente R$ 110. Os adaptadores são feitos em impressora 3D com parceiros como o Laboratório Biofabris, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o Centro de Tecnologia da Informação (CTI) Renato Archer e a Ambev, e mais makers estão sendo convidados para a produção. Cada uma tem custo aproximado de R$ 25.

Existem, ainda, despesas com montagem, transporte e logística. Há também o gasto com uma cinta de fixação (fixador cefálico), que custa em torno de R$ 12 (cada).

Distribuindo as máscaras

O Motirõ está em contato com hospitais de Manaus (AM), Recife (PE) e Fortaleza (CE) para enviar o primeiro lote com 500 máscaras para CPAP ainda nesta semana. Até hoje (27), foram confirmados 3.833 casos da covid-19 em Manaus, 4.898 em Recife e 5.833 em Fortaleza.

O grupo disponibiliza um formulário de cadastro no site, para que hospitais interessados possam conhecer o projeto. São pedidas informações técnicas de profissionais, quantidade de leitos e afins, que ajudam a determinar quantas máscaras enviar e para qual lugar.

Apesar de ser uma solução de baixo custo e já em fase de desenvolvimento, Souza contou que ainda há receio em adotá-la. Segundo ele, houve "muita dificuldade com relação ao corpo clínico, mesmo nos hospitais que está em teste". Isso acontece porque o produto ainda não foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo ele, as conversas com o órgão regulador estão avançando em paralelo à produção do equipamento.

A partir dos testes feitos em hospitais, os primeiros dados sobre o uso da máscara no tratamento da covid-19 serão compartilhados. Souza indicou que a impressão inicial de médicos e fisioterapeutas respiratórios é positiva.

Feito para o SUS

No começo do projeto, Souza disse que o business foi um problema, por ter atraído "pessoas que tinham interesse comercial". Segundo ele, isso não existe mais porque a frente já avançou muito em termos de desenvolvimento. "Como o nosso fim é o SUS, o problema maior que a gente tem hoje é a própria diretoria desses hospitais entender a necessidade da máscara, entender que ela de fato é útil e deve ser utilizada", afirmou.

Ele explicou que essa necessidade é compreendida, "mas [as diretorias] não querem se responsabilizar por isso [utilizar a solução] por vários medos inerentes a uma instituição pública". Se alguma pessoa física também quiser fazer parte do projeto, pode encontrar os detalhes no site do Motirõ; entretanto, ele foi criado para um fim único, que é dar suporte aos hospitais da rede pública de saúde.

Em paralelo, um grupo de engenheiros da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP) criou um ventilador pulmonar que foi testado e aprovado no Instituto do Coração (Incor) e no Hospital das Clínicas (HC) da USP. O ventilador, chamado de Inspire, tem custo médio avaliado em R$ 1 mil e pode ser fabricado em 2 horas, segundo os pesquisadores.

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Fontes

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